















A maneira como Chester mudou a minha vida e a de milhares de pessoas
A trajetória do artista, sua história de vida, sua música e o impacto de sua morte
ÍNICIO >> Matérias >> Dezembro 2017 >> Chester
Incrível como a música pode transformar o mundo e a vida das pessoas. Uma letra, uma canção, ou no caso todas as canções de um artista ou banda, pode praticamente descrever a nossa vida e dar sentido para as dores e para as alegrias. Eu tive o privilégio de ter isso na minha vida. Mas como que se fosse uma maldição perdi os meus dois ídolos do rock, Chester Bennington da banda Linkin Park e Chorão da banda Charlie Brow JR.
Infelizmente a gente acha que nossos ídolos são deuses, que estarão ali pra sempre, mas o tempo passa e coisas acontecem. Em ambos os casos, meus heróis morreram de suicídio. Chorão que tinha vicio em drogas, foi alvo de uma overdose de cocaína, no meio de um turbilhão de sentimentos. Assim como Chester, Chorão era um homem de sucesso, todo mundo cantava ou canta até hoje musicas criadas por ele, musicas que falam do dia a dia, dos amigos das coisas da vida, das lutas e das glorias, mas mesmo assim, como todos nós, Chorão passava por problemas pessoais, se sentia sozinho, sem amigos, separado da mulher que amava, pela qual escrevera inúmeras cações. Havia recentemente remontado a banda, com antigos integrantes que se dividiram por uma briga antiga, e um deles, acabou também se matando. Champignon era baixista da banda Charlie Brown, e quando soube da morte de Chorão, acabou se matando também.
No caso de Chester, uma depressão enorme tomou conta de si, e o estopim foi a morte, também por suicido de seu melhor amigo, o músico Chris Cornell.. Com milhares de fãs espalhados pelo mundo todo, com esposa e seis filhos, amigos e familiares, mesmo assim, Chester carregava consigo uma dor desde pequeno. Contava para todos sobre os abusos que sofrera na infância por um amigo da família, e como isso o incomodava. Antes e depois do sucesso de Linkin Park, Chester tinha problema com drogas e vivia para lutar contra. Nos últimos anos sua luta era mais contra o álcool, esse que é o refúgio de muitos para esquecer o dia a dia e as coisas ruins. Em meio a tantas conquistas consideradas dignas de um cara de sucesso, não demonstrava sua depressão, suas angustias, oque nos fez ser pegos desprevenidos diante de sua morte.
Não que estejamos prontos para a morte de alguém, mas a forma inesperada e a atitude de que não interessava mais viver, faz com que você questione cada sorriso, cada show e tente entender, oque foi que não vimos? Em que momento poderíamos ter ajudado?
Isso me faz pensar, nas inúmeras pessoas que desistem de tudo e decidem deixar de viver, por não ver mais sentido nas coisas. Nas pessoas ao nosso redor, amigos, familiares, conhecidos, que sofrem com isso e nem ao menos paramos para observar.
Novos dados divulgados pelo Ministério da Saúde mostram que o índice de suicídios cresceu entre 2011 e 2015 no Brasil. Segundo a pasta, esta é a quarta maior causa de mortes entre jovens de 15 e 29 anos. Em 2011, foram 10.490 mortes: 5,3 a cada 100 mil habitantes. Já em 2015 o número chegou a 11.736: 5,7 a cada 100 mil, segundo dados são do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM).
Se pararmos pra pensar que todas essas pessoas estão sofrendo ao redor do mundo, e que isso se repete a cada ano, sentimos uma dor imensa. O que anda levando as pessoas a desistirem de tudo, da vida, da família, dos amores, para dar um basta?
Linkin Park foi a minha primeira paixão. Naquela época e até hoje, nunca vi algo que tenha me conquistado tanto, que tenha prendido tanto a minha atenção, é algo totalmente apaixonante da minha parte. E simplesmente não teria sido de outro jeito. Chester Bennington cantava não só com sua boca, mas também com seus olhos, braços e pernas. Chester se comunicava usando palavras e todo seu corpo (e qualquer outro objeto que estivesse perto dele). Mas, principalmente, quando Chester falava, ele não o fazia como um rockstar com mais de 70 milhões de álbuns vendidos, mas sim com um cara normal, pé no chão vindo de Arizona (pense numa cidade de interior) que simplesmente estava vivendo os sonhos pelos quais lutou todos os dias. Como eu e você que queremos ser algo, um médico, advogado, bombeiro. Mas ele queria ser cantor.Vou falar um pouquinho dele pra vocês.
Chester Charles Bennington nasceu em 20 de março de 1976, em Phoenix, Arizona. O mais novo de quatro irmãos, sua mãe, Susan, era enfermeira e seu pai Lee, era detetive policial. A família se mudou muito dentro do próprio estado. Mais tarde, após ter ficado famoso, Chester revelou que, aos sete anos de idade, ele foi vítima de abuso sexual de um cara mais velho durante seis anos, mas que ficou com ele durante um bom tempo. Seus pais se divorciaram quando Chester tinha 11 anos, deixando-o sob custódia do pai, mas como se ele não tivesse ninguém no mundo. “Abandonado” por sua mãe e incapaz de se conectar com seu pai emocionalmente instável, que focava sempre em trabalho, Chester fechou-se para si mesmo. Enquanto estava “jogado por aí, como um boneco de pano” em seu quarto ele encontrou conforto nos desenhos, poesia e, logo, na música. Ele aprendeu piano, encontrou pessoas para idolatrar como Depeche Mode, Led Zeppelin e Stone Temple Pilots e logo começou suas primeiras investidas na música, com sua banda Grey Daze. Impossível não olhar pra ele e não se imaginar, em cada passo, cada atitude e decisão tomada.Como nem tudo são flores, Chaz quicou de banda em banda, até se fixar na Grey Daze, que chegou a fazer sucesso por um tempo. Em meio aos shows e um período trabalhando no Burger King, Ele se casou com Samantha, e conseguiu manter as drogas sob controle. Logo veio o fracasso da Grey Daze, que fez com ele desistisse da carreira de músico. Como ele mesmo já disse em entrevistas: “Música era uma namorada com quem eu havia terminado.” Mesmo assim, sua vez chegaria. Foi então que, em 1999, em seu aniversário de 23 anos, um conhecido da música mostrou a fita demo de uma banda de Los Angeles, que tinha o nome de Xero, apesar dos julgamentos iniciais de que eles “seriam apenas outra banda”, Chester ouviu o bastante para “Olhar para Samantha e dizer: É essa aqui”. Mal sabia ele que havia uma vida e carreira gloriosa te esperando. Chega a me dar calafrios.
Único problema: A Xero (primeiro nome da banda atual, mas que em seguida mudou para Hybrid Theory) não tinha confirmado nada. Ao invés disso, ele se viu ao final de uma fila para uma audição. Sua vez de se apresentar chegou. Após sair do estúdio, o próximo candidato se virou para ele e os outros integrantes da banda e disse: Seria loucura se vocês não pegarem esse cara.“ Por tudo isso, os futuros colegas de banda de Chester ouviram uma voz que ecoaria por estádios no mundo todo.
A sua fusão de rap e hip hop com rock e metal pode não ter sido inovadora – Korn, Deftones e Limp Bizkit foram precursores num caminho que o Linkin Park seguiu – mas ainda assim se eternizou quando o mainstream (o público que consome música, o grande público alvo), aderiu ao rock, talvez de forma nunca vista antes; quando um videoclipe bem produzido (no qual Hybrid Theory possui cinco, ainda que agora um pouco ultrapassados), ou um single promocional bem escolhido poderiam fazer uma carreira. Dada essa oportunidade, o Hybrid Theory foi um álbum de metal que escorreu na porta de entrada da música mundial e se misturou no seu meio e observou aqueles que tomaram um gole, logo vestirem casacos grandes, jeans ainda maiores e correntes de metal. Ele oferecia uma sensibilidade pop que faltava no Korn; uma conexão emocional com a qual o Limp Bizkit nunca se deu bem, e uma entrada de boas vindas onde os berros “fodam-se as pessoas” que o Slipknot berrava repetidamente sem ser muito ouvido. Com o seu lançamento, uma nova geração de fãs de metal foi criada, exposta e bem vinda ao mundo do rock e artistas que posteriormente tocariam em bandas como Bring Me The Horizon, Bury Tomorrow e tantas outras nasceram logo depois. Uma década depois, eles tocaram o álbum inteiro no Download Festival; na multidão, milhares de pessoas, de todos os tipos, que nunca estariam no festival se não fosse por aqueles 37 minutos e 45 segundos de música. 37 minutos abençoados.
Enquanto o mundo se movia numa velocidade rápida para descobrir quem o Linkin Park era, através das letras de música que o enigma de Chester se revelaria aos poucos – uma charada complicada e abstrata que começou no Hybrid Theory e continuou durante sua vida na banda. Chester explicou sua composição musical, “eu fui capaz de acessar todas as coisas negativas que aconteceram comigo durante minha vida ao anestesiar minha dor, e passar isso pra minha música”.
Só o Hybrid Theory tocou temas como depressão, paranoia, ansiedade e abuso. Em Papercut, a música favorita de Chester nesse CD, e a que ele acha que mais resume a banda, ele fala sobre “um turbilhão dentro da minha cabeça” e a incapacidade dele de “parar o que ele ouve lá dentro”. Crawling, enquanto isso, que concedeu a banda o primeiro de seus dois GRAMMYs, “era sobre sentir que eu não tinha controle sobre mim mesmo se tratando de álcool e drogas”. O Meteora, de 2003, abordou temas de amor, solidão e perda.
Hoje a internet está inundada com pedidos de que as pessoas se abram se elas estão sofrendo: quebrar o estigma da depressão, falar sobre saúde mental. Mas Chester Bennington fez exatamente isso. Nós apenas não estávamos ouvindo. Chester não estava sofrendo em silêncio. Ele nos disse. Ele nos disse diretamente. Ele disse aos seus companheiros de banda. Porra, ele disse em cada álbum, em cada música, em cada verso. Me senti com raiva e me senti envergonhado. Me pergunto o que eu poderia ter feito. Conheci Chester há 15 anos atrás, já fazia parte do que eu sou. É doloroso ver uma parte de você morrer.
Com músicas que salvaram milhares de pessoas do suicídio. Músicas que expressavam as angustias e os medos de cada um, que nos protegia de maus tratos, da violência doméstica, da falta de amor e carinho da família, em lutas contra bullying, ouvir sua música era uma forma de expor essa dor para fora. Era uma forma de se sentir pertencendo a algo superior, maior que nós, quase que como uma conexão com o universo, beirando a religiosidade.
A determinação do vocalista era tanta que para fazer sucesso com sua nova performance, ele dormia no carro, no chão dos estúdios de ensaio, e quando sua sorte era grande, conseguia um sofá. “Eu ficava animado de estar com os caras e fazer as coisas”, dizia Chester na época. “Desde o primeiro dia nunca ficou chato; sempre era interessante e empolgante.”
Só isso foi o suficiente para Chester decidir que não tinha volta. A cidade de Phoenix estava pra trás; o Hybrid Theory daria certo, fizesse chuva ou sol. Hybrid Theory que logo mais se chamaria Linkin Park, em homenagem ao parque que Chester passava para ir até o estúdio gravar o álbum. “Todos nós fizemos sacrifícios, mas o do Chester foi único”, disse Brad a Rolling Stones em 2002.
Milhares de palavras, nos últimos 17 anos, foram dedicadas ao que aconteceria a seguir. O Hybrid Theory pode ter sido encerrado ao mudarem o nome para Linkin Park, mas aquelas palavras, mesmo assim, deixariam uma marca permanente no rock e metal da mesma forma. Até hoje, o álbum de estreia da banda que possui o nome de Hybrid THeory, lançado em 24 de outubro de 2000 vendeu 30 milhões de cópias no mundo todo. E é até hoje considerado o álbum de estreia que mais vendeu no século 21.
Mas ele é, com certeza, muito mais do que isso para milhões de pessoas ao redor do mundo, por um bom tempo. Seu falecimento no dia 20 de julho, de suicídio em sua casa em Los Angeles, aos 41 anos, deixa uma lacuna. Uma das vozes mais icônicas e poderosas. Deixa a música eternizada de um líder carismático – um showman – que podia fazer mesmo a maior plateia do mundo se sentir intimidada, como se cada palavra e nota fosse para você e somente para você. Oh céus, que poder sua música tinha em mim, cada verso, cada letra, cada grito. Deixa, aqueles mais próximos a ele, sem um marido, pai, filho, companheiro de banda e amigo. Deixa o mundo inteiro com uma perda original e única.
“O amor é algo que faz com que nos tornemos pessoas melhores,” ele disse em 2012. “É o que nos mantém conectados aos outros. É o que nos dá compaixão. É o que nos dá o caminho para realizar coisas grandiosas em nossas vidas, e é uma coisa com a qual você sempre pode contar quando acha que não pode contar com mais ninguém.”
Depois de Hybrid Theory, vieram os álbuns Meteora, Minutes to Midnight, A Thousand Suns, Hunting Party e por último, e tão expressivo quanto o primeiro, o álbum One More Light, que novamente retrata sobre brigas mentais e problemas emocionais que todos nós passamos.
A tragédia é que, nos seus últimos dias, Chester se sentiu sozinho, mesmo com milhares de pessoas ao redor do mundo o amando tanto quanto os últimos dias nos mostraram.
“O Hybrid Theory mudou tudo para nós”, disse Chester em 2014. “Para mim, parecia uma justificativa para todo o tempo que passei no Arizona fazendo música que não era boa, para alguém em Los Angeles dizer aos caras da banda ‘oh, eu conheço um cantor no Arizona, vocês deveriam trabalhar com ele’ Eu realmente devo muito ao que fizemos como banda desde aquela época, e por qualquer razão, às tentativas e sofrimento que passamos ao fazer daquele álbum um sucesso. ” E continuou: “Conforme nossa carreira seguiu, a importância dela para as pessoas é algo que ouvi cada vez com mais frequência, ” Chester disse nas vésperas do festival, enquanto conversava com Oli Sykes do Bring Me The Horizon: “Pessoas que ouviam o Hybrid Theory quando eram crianças e agora dizem ‘sua banda é o motivo de eu ter entrado para a música,” ou ‘suas músicas falam comigo de modo que ninguém mais faz.’ E é muito legal ouvir como sua música afetou suas vidas; como um fã de pouca idade vai ao show e pensa ‘é isso que quero fazer…'”
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